¨ Um minuto ou dois, não mais..

Um minuto ou dois, não mais para perder.
Mas não há em um nem dois minutos a mais
na fendura sem sonho do meu sono.
e tudo dura pouco, e o poema está sempre perdido.

São as palavras "morte" ou "fim"
que começam por ser minhas, para depois
enfim quererem ser nossas.
Mas nunca chegam a ser de todos.
Saõ sempre de alguém.

A solidão começa neste silêncio criado e
passa tudo muito depressa de mim para mim
sem que eu saiba quanto tempo passou.

Como se o regresso não me fosse já estranho,
e o tempo não me fosse já esquecendo,
e o corpo não fosse revelando as palavras
de que atristeza me pesa e constitui.

Dói sempre mais o que já não acontece,
mas que promente sempre chegar.
O poema é a esperança na dúvida.
Sou nunca tendo sido. E morro, já não vivo.
as palavras trocadas, mas se as troco
é para chegar ao fim.

(Nunca o tempo vos perdeu e nunca a morte
vos acometeu?
- Nunca ninguém começou. Disseram-me.
Júlia morreu. Quem mais? Todos.
São mais os mortos do que os vivos.)

Esse tempo que passou, normalmente, só o gasto comigo.
as palavras "morte" ou "fim",
repito-as antes de sair de casa, e depois enquanto caminho,
antes de regressar.
Serei sempre uma, entre tantos outros,
à procura de quem morreu.
Um neto à procura de um avô,
e daí pra frente, até ser um, entre muitos,
sem mais nada (ninguém) em que pensar.

Pais, amigos, namorado, "filhos"..
(Nunca conversamos sobre isto.)
Todos substituídos no fim por alguém que vos chora.
Como num poema.
Saudade com que vos abraço,
não vos tendo e não vos querendo aqui.


(passou.. 2006)